domingo, 24 de maio de 2009

O propósito do combate

Desde os seus primórdios que o rpg evoluiu de simples jogo de combate de miniaturas, para algo que hoje em dia não passa sem ter umas páginas dedicadas ao combate. E, se o gorila de 400 kilos de todos os rpgs pode ser ainda considerado um rpg, então este deu uma volta completa e voltou a ser um jogo de miniaturas. Há obviamente muitos e vários rpg's que não tocam no assunto do combate físico, mas estes versam sobretudo em conflictos internos, e irei reflectir sobre estes num post futuro. Por agora, quero debruçar-me sobre aqueles que considero ser os três principais propósitos dos combate em roleplaying games: As Personagens são os Heróis, O Combate como Ferramenta para Avançar a História, e O Próprio Combate é o Propósito do Jogo.
1 - Mostrar que os personagens são heróis

Este ponto existe de uma maneira ou de outra em todos os jogos. Ninguém quer ser um Zé Ninguém, e mesmo nos jogos que versam a decadência humana os jogadores querem ganhar, pois se não querem, não podem continuar a ser miseravelmente humanos, certo?

Alguns jogos são propositadamente feitos para ser assim, para mostrar o quanto o personagem é feio, porco e mau, ou se calhar bonito, amigo e bom, se for bishonen. Exalted, Wushu e o The 101 aqui da casa especialmente, entre muitos outros, são feitos para este ponto. Exalted tem as regras de stunt, que ajudam com dados uma descrição que agrade à mesa, Wushu ajuda com dados uma descrição detalhada, e The 101 ajuda elevando o Cool Factor.

Três sistemas diferentes com o mesmo propósito: descrições interessantes mostrando o personagem numa luz heróica ajudam com que o jogador seja mais facilmente bem sucedido.

2 - Fazer avançar a história, os jogadores têm pouca ou nenhuma intervenção

Uma situação recorrente em vários jogos é quando o GM monta um cenário para um combate excitante que serve apenas como ponte para um evento mais importante, mostrando uma de várias situações: ou o combate está a correr mal para os jogadores, por causa de más decisões ou má sorte, e a história depende que eles vivam, e por isso o GM faz aparecer a cavalaria, que salva o dia, a pele dos personagens, e potencialmente faz aparecer NPC's importantes para os personagens; o combate também pode estar a correr mal para um personagem, e o GM altera os resultados dos dados para que o personagem saia vencedor; ou, independentemente do resultado do combate, o evento importante que o GM tinha planeado acontece. Nada disto é terrivelmente mau, se toda a gente concordar e estiver a divertir-se. No entanto, é de notar que pouca ou nenhum influência existe da parte dos jogadores no desenrolar da história.

3 - O propósito do combate é o próprio jogo

Existem vários jogos assim, do qual o exemplo derradeiro é quarta edição do Dungeons and Dragons (D&D 4e). O jogo não vive sem o combate. As regras estão descritas de tal maneira que as várias possibilidades que podem ocorrer num combate envolvendo magia estão cobertas na sua quase totalidade, com sistemas para distâncias, peso e carga têm efeito na efectividade do personagem, assim como a sua perícia nas diferentes armas, tal como os diferentes efeitos que as várias armas, feitiços e objectos podem ter nos personagens. Está tão detalhado e é uma parte tão forte do sistema que tudo o resto toma um distante segundo lugar.

Outros sistemas assim, embora com uma carga de combate menos forte, são o GURPS, que é modular na sua complexidade mas que possibilita um grau de variedade no combate quase idêntico ao do D&D4ed, e o Savage Worlds, que é bastante mais simples que os anteriores, mas que versa particularmente o combate táctico de miniaturas.

Neste terceiro ponto as escolhas só podem estar do lado dos jogadores, caso contrário o jogo falha. O jogador deve ter sempre, e nunca lhe deve ser retirado, o poder de escolher que tipo de acção o seu personagem toma. O sucesso ou insucesso do seu personagem no combate deve depender mais dele do que do resultado dos dados.

Outros casos

Há um jogo que não conheço por nunca ter jogado, mas que me dizem ser tremendamente táctico, que é o Spirit of the Century. Neste jogo o jogador pode invocar Aspectos do seu personagem para mudar a situação a seu favor, mudando a abilidade a usar no conflicto para uma abilidade mais alta, e pode criar novos Aspectos que serão invocados para criar modificadores situacionais, além de ter ainda um aspecto de gestão de recursos, na forma de Fate Points. Isto é diferente dos restantes sistemas de combate porque não utiliza o tipo normal de decisões "pedra-tesoura-papel", e não está directamente dependente das situações existentes. Aqui o jogador está intimamente ligado à maneira como o combate é resolvido, e são as suas decisões que afectam o resultado do mesmo, e o combate serve para mostrar o personagem como herói, além de inserir intimamente o personagem na história, pois são os seus Aspectos, e sua invocação, que fazem andar a acção.

Este tipo de jogo promete ser divertido e envolvente, do qual existem vários exemplos, todos baseados no sistema FATE. A experimentar.

Existe também um jogo que ainda não joguei, mas de que já fiz um hack, chamado 3:16 Carnage Among the Stars. Aqui o combate está presente a 100%: os personagens são marines galácticos que combatem monstros em nome da Humanidade. O combate aqui serve como veículo para uma viagem de auto-descoberta, já que os jogadores podem invocar memórias de outros combates para terem bónus no conflicto presente. Merece ser visto com atenção.

Por causa deste post comecei uma discussão na rpg.net sobre a possibilidade de ter combate táctico sem qualquer tipo de aleatoriedade. Até agora, os resultados não parecem promissores, com alguns posters a fazer referências a xadrez...

2 comentários:

Charles disse...

Xadrez :P Vai muito do grupo e dos jogadores, que podem preferir partidas ou campanhas focadas na evolução do personagem (geralmente D&D) que tornam o jogo mais mecânico e "enxadrístico", ou na interpretação e tramas que tornam o jogo muito mais aberto e teatral. Como sempre, é questão de saber como agradar seus jogadores e se divertir. Particularmente prefiro um equilíbrio, mecanismos de batalha que sejam mais um jeito de caracterizar o personagem e inventar histórias (sou um grande fã de 3d&t, onde por exemplo um "ataque por Força" pode significar uma arma, arte marcial secreta, tentáculo sombrio e o que a imaginação permitir) e menos um peso ou "obrigação".

Ótimo post, vou dar uma conferida em alguns desses jogos! Leitor brasileiro aqui ;)

Rui Anselmo disse...

Obrigado pelo teu comentário e interesse, Charles! Fico sempre contente de poder agradar. :-)

Queria só deixar seguinte ponto:

Eu não considero o D&D como um jogo focado na evolução do personagem, a menos que te refiras ao aspecto que o jogo tem de evoluir o personagem para combater monstros do próximo nível.